terça-feira, novembro 15, 2011

87 ANOS, ATROPELADA E MAL FALADA.

Marcelo bateu com seu carro em uma velhinha. Ela tinha 87 anos. Marcelo matou uma pobre velhinha de 87 anos. Atropelada!
Numa distração inexplicável ele não viu quando a pobre velha de vestido estampado atravessava a faixa. Faltavam só duas tiras de cal para ela estar a salvo na calçada. Só duas! Devia ter andado mais rápido, ela pensaria se tivesse sobrevivido.... Mas ela se foi. Foram com ela. Foi. Foi ele, o Marcelo.

Sem chance de último suspiro, sem poder contemplar o mundo pela última vez ou de ouvir um tu.......tu....... dos aparelhos que sonhava em estar ligada um dia, sentiu a força de muitos quilômetros por hora romperem o seu frágil motor da vida. Na verdade ela já vivia em ponto morto desde que seu marido foi dessas para uma melhor. Era só, a coitada. Dona Esmeralda, 87 anos, velha sozinha nesse mundo, pobre velhinha que morreu atropelada – um horror!

Voltando ao banco do motorista, lá estava o Marcelo. Na emoção do calor, ainda branco de susto, com os lábios da cor dos cabelos da velhinha, Marcelo lembrou que estava perdido. As leis de trânsito eram as mais severas do país. Ele tinha lido na internet há pouco tempo que elas eram muito piores que as criminais. Ele estava perdido! Estava! Sem pensar muito foi logo se adiantando. Desceu do carro chamando a pobre senhora de maldita. Ela pagou, afinal. Achou que ele nunca ia descobrir? Pois sim. Marcelo soube de tudo. Ela estava saindo com o s. Guilherme do 702 para jogar gamão todo fim de tarde enquanto ele trabalhava. Onde é que ela pensava que ia com aquele vestido estampado? Ele era um idiota, por acaso? Antes que ela consumasse o ato, ele a atropelou bem ali, num golpe certeiro da sua arma de 4 portas. Tudo de caso pensado. Crime passional, a imprensa noticiou.

Avó de ninguém nesse mundo, dona Esmeralda não teve defesa. Já o Marcelo, réu primário, respondeu em liberdade. Dona Esmeralda ficou muito tempo ainda na boca do povo, que achava pouco. Onde é que já se viu? Uma senhora daquela idade...


(A partir de uma análise do colega Vinícius Gontijo sobre o nosso código criminal)

domingo, outubro 16, 2011

O Verão do sol, do biquíni, da água de coco,
das roupas coloridas e do vento nos cabelos
foi servir de nome logo para um dia com uma hora a menos.
Vingança do Inverno ciumento.

sábado, outubro 08, 2011

Seu Corrêa - O taxista que me pagou um café, mas cobrou a corrida.

(Suposta – e floreada - visão do Taxista)

Era uma moça com uma mala. Ela parecia cansada. Tinha decido de uma táxi branco como o meu e cambaleou com a bagagem como se fosse pesada demais pra ela. Não tirou nenhuma chave da bolsa, o que me fez concluir que era uma visita. Muito cedo para uma visita aparecer, eram 7 da matina. Eu tinha acabado de chegar ao ponto e não havia pego nenhum passageiro ainda. O movimento estava parado e me permitiu observá-la. Os transeuntes são os personagens dos taxistas. Os assistimos como a única novela que conseguimos acompanhar. Os protagonistas normalmente são os passageiros, alguns de cinema mudo, mas ainda sim protagonistas.

Voltando a cena da moça, ala não tinha uma chave e estranhamente não tocou a campainha. A vi retirar o celular da bolsa e ligar. Ligou uma, duas, três vezes. Impaciente, encostou-se na portaria do prédio sem porteiro. Havia mais que cansaço naquele olhar. Olhou para meu táxi e não me viu. Seus olhos percorriam outro destino. Acredito que pensou em ir embora. Mas não foi longe. Carregou a bagagem e sentou-se na padaria ao lado.

Calculadamente escolheu uma cadeira que a deixava de frente para a portaria, de forma que ela pudesse perceber qualquer movimento. Na primeira vez que pensei em me aproximar, surgiu um passageiro. Droga. Tão cedo e gente já pensando em corrida? Mas eu não podia recusar cliente. Fui o mais rápido que pude naquele trânsito infernal que enfrento desde que sai da minha Paraíba, há mais de 30 anos. E ele nunca pareceu me castigar tanto com a sua demora. Tinha certeza de que quando eu voltasse para o ponto ela já não estaria mais lá. Mas estava.
- Ainda não tocou a campainha?
- Como?
- Vi quando você chegou. Não fica triste não.
- Não estou triste não, apenas esperando.
- Toda espera é triste, não é mesmo?
- Pode ser.
Eu percebi que ela não queria conversar. Percebi também que meu próximo passageiro não queria esperar. Parti dizendo que voltava logo. Ela sorriu amarelo, com certeza torcendo para que não estivesse lá quando eu retornasse. Nada pessoal, tenho certeza. Afinal, o que ela mais queria era que uma porta se abrisse e a tirasse dali. Eu só queria conversar com ela, não sei bem o motivo, mas nós, taxistas, percebemos quando devemos puxar assunto. Aquela moça era do tipo de passageira que se sentava no banco da frente.

Sem querer e sem ter escolha, fui para mais uma corrida, dessa vez era bem perto. Voltei e ela estava na mesma posição que deixei: queixo apoiado na mão, apoiada no braço, apoiado na mesa. Ofereci então meu apoio.
- Já tomou café?
- O do avião.
- Mas aquilo não é café. Vou pegar um pra você.
- Não, não. Não precisa, obrigada!

Menos de um minuto depois eu estava sentado na mesa com um café em cada mão. A moça ficou sem graça, mas bebeu. Não se recusa um café de um senhor. Principalmente quando ele já passou dos seus 60 anos. É. Isso facilita a aproximação, mas dificulta outras coisas. Mas não falemos aqui de quais intenções eram as minhas. Naquele momento, apenas tornar a espera da jovem menos lenta. Ela mostrou interesse pela minha história. Contei da minha Paraíba, das minhas andanças, da família, da saudade da terra. Só depois percebi que a esperta moça havia conseguido tirar todo o foco de cima dela. E quando perguntei quem ela havia ido visitar, mais um passageiro me chamou. Aquela passageiro mal educado não podia esperar nem mais um gole.
Quando voltei, a moça já não estava lá. Seu café estava por dois dedos. Havia uma marca de batom no copo. Não consegui terminar meu café aquele dia e deixei as outras refeições pela metade. Teria ela tocado a campainha ou teria se tocado?
Não sei. Dias depois ela entrou no meu táxi. (Numa cidade daquele tamanho e ela entrou justo no meu táxi!) Mas ela falou ao celular a viagem toda, aposto que de propósito só pra eu não puxar assunto. Só de raiva eu cobrei a corrida. Bandeira dois.

segunda-feira, agosto 01, 2011

Num dia você sente.
No outro, sente muito.

domingo, julho 24, 2011

A saudade me sente.
Sente meu cheiro.
Sente meus passos.
Sente que estou ali.
E aí nos encontramos.

sábado, julho 16, 2011

Os peitos da Carolina e o Rodrigo Lombardi

- Então?! Vamos dar uma turbinada nessa prótese?
- Pois é, doutor... O senhor viu que agora tem novela das onze?
- Minha esposa falou que ia começar, mas ainda não assisti.
- Pois é! A Carolina Ferraz tá linda!
- ESCALARAM A CAROLINA FERRAZ?????!!!!!
- Protagonista. E ainda tá pegando o gato do Rodrigo Lombardi.
- Ela tá pegando o Rodrigo Lombardi na novela?
- Sim, doutor.
- Putz!
- O Ro-dri-go Lom-bar-di! E sem peito!
- Meu Deus...
- Ah! E ele ainda tem super poderes. E olha que ela não tem peito, doutor!!!!!
- Putz! Mas isso não podia ter acontecido de jeito nenhum.
- Como?!
- Lançamos a Gisele que quebrou a dinastia das tábuas. Bombamos a carreira da Daniele Winitz. Criamos um casamento fake com um garotão pra ela ir pra mídia e tudo. Você não imagina como a demanda por próteses de seios aumentaram.
- Imagino sim. Todas as minhas amigas colocaram.
- Pois é! Mas a grande estratégia era manter a Carolina Ferraz fora da mídia.
- Jura?
- Ela é uma relutante! Todos os cirurgiões já procuraram por ela dando todas as ml do mundo de presente. E nada!
- Mesmo?! Ela é a única famosa sem peito, né?! Estranho...
- Há quanto tempo você não vê aquela tábua em uma novela?
- É verdade. Faz tempo mesmo que ela não aparece...
- Fomos nós da Comissão de Siliconística que mantivemos ela na geladeira. Anos bancando o silicone das globais e no primeiro descuido ESCALAM A DESPEITADA-MÓR??!!
- Calma doutor! A novela é das onze. Ninguém assiste.
- Ah! Menos mal!
- Mas em compensação, pelo horário, tem nu. E ela ontem apareceu super reta e... com o Rodrigo Lombardi.
- Er... mas então, sua linda. Quantas ml dessa vez, hein?!
- Na verdade eu queria retirar, doutor. É que a Carolina tava usando uma blusinha ontem tão sexy e sem sutiã. E o Rodrigo Lombardi, doutor?! Ele só olhava pros olhos dela. O Rodrigo Lombardi, doutor. E ele ainda tem superpoderes.
- Ai-Meu-Deus! Onde é que eu anotei mesmo o telefone do Maneco? Ele precisa voltar com a Vera Fisher. Precisa!

quinta-feira, julho 14, 2011

O Hacker do Amor

Joaquim era detetive particular fazia 37 anos. Era dos bons tempos da pexeira e da bala. Era da época do crime passional. Ah! Como adorava esse termo: crime passional. Até batizou seu cachorro assim. Passional, para a tristeza do dono, era um cachorro pacato, manso, quieto. Ele sonhava com o dia em que o bichinho o mordesse por vê-lo fazer carinho em outro cachorro. Mas não. Ele abanava o rabinho e vinha brincar junto. Era mesmo o fim dos tempos. Mas o que o incomodava de verdade era o silêncio do seu telefone. Como um músico deprimido e enferrujado, ele tocava cada vez menos. E quando tocava, era aquela decepção . O trabalho já estava pronto.
O que ele mais gostava na vida era de juntar provas. De pegar casos difíceis. Descobrir o fio desencapado daquele marido exemplar. Encontrar um cabelo na sopa da dedicada esposa. Isso para ele era a glória. Ah! Os bons tempos.
Hoje, as evidências tomaram o lugar das pistas. Está tudo ali no mural para quem quiser ler. Existe até um negócio que conta cada passo do sujeito. Mas ele sabe que isso é pra despistar corno. Claro que é. Só pode ser.
Mas para Joaquim, o fim da picada era seguir pelo twitter. Era o cúmulo do constrangimento. Ele que alugava táxis só para dizer: “siga aquele carro” agora ficava de bermuda velha atrás de um computador. “Cria um fake e segue ela. Manda DM, pra ver se ela dá moral, manda?!”. Aquilo era muita humilhação.
E a quantidade de seguidores que havia por ali? Ele lembrava sempre dos tempos de glória, em que Detetive Particular tinha um status que fazia dele o próprio Sherlock Holmes.Hoje, quando Joaquim diz que é detetive sempre houve: “Nossa, eu também sou. Me solta no google pra você ver se não varro a vida da pessoa em meia hora”. Ele tinha vontade de se deletar.
Joaquim precisou dar seus pulos, por isso montou um curso chamado Hacker do Amor. Em 3 dias ele promete fazer a pessoa descobrir se o amado está realmente nos locais em que deu chekin ou se apenas deu uma rapidinha ali; descobre entre as novas amizades, quais são ex-peguetes e, com o pagamento de um adicional, até consegue entrar na caixa de DMs.
Ele consegue pagar as contas, tem até uma clientela boa. Mas teve vontade de trabalhar num banco quando viu que sua última cliente traída deixou um recado cheio de raiva na página do cafajeste, xingou muito no twitter e deletou seu perfil em seguida. Ô saudade dos tempos das balas e pexeiras. Pobre @Joaquim.

segunda-feira, junho 27, 2011

Gelo

Saudade de frio é assim.
Quer corpo cobertor.
Quer seu corpo cobertor.

sexta-feira, junho 10, 2011

O tempo passa rápido.
Mas só para quem nunca teve que contar os segundos.

quinta-feira, junho 02, 2011

Resolvi ser engraçada.
A partir de agora todas as minhas frases começam com: se tem uma coisa que eu não entendo...

domingo, maio 29, 2011

Minha rosa dos ventos se despetalou.

terça-feira, maio 17, 2011

Seu coração batia devagar e em silêncio.
Ninava a sua alma dolorida.
sssssssssssssssssssssssssss

terça-feira, abril 12, 2011

(vlupt)

.cabeça de vento e
menino distraído,
meu pulmão já foi bolso furado,
que perdia o ar por onde andava.

sábado, abril 09, 2011

Disk Amor

- Você ligou para Disk Amor! Em alguns instantes vamos atendê-lo. Tem certeza de que deseja permanecer na linha? Também oferecemos outras opções: para amizade divertida, disque 1; para fast sexo, disque 2; para chocolate, disque 3.

(tlic)

- Quantas caixas, senhora?

lacuna na coluna

.
Carrego
tantas
dentro
de mim
que qualquer
dia desses
a minha
pobre alma
reclama
de
escoliose.

.teoria do choro.

Ela chega primeiro ao nariz,
dá uma tremidinha bem de leve e a danada sobe correndo em direção aos olhos.

Para mim, lágrima é um espirro mal sucedido.
Provalmente de um coração resfriado.



(Sussy Côrtes - Pós-doutorada em Chorologia pela Universidade das Ciências Ocultas, a mesma em que o Chicó estudou).

sexta-feira, abril 08, 2011

A leitura deste é de responsabilidade exclusivamente sua.

Chegou mascando chicletes.
Odiava mascar chicletes, mas odiava bem mais escovar os dentes.
Jogou-se no sofá. O "se" refere-se a sua cabeça, que pendeu sem pestanajar.
O teto estava tão branco que ela teve vontade de cuspir só pra sujá-lo, mas lembrou que o cuspe para o alto é dos mais vingativos.

Ali ficou, a espera de que algo acontecesse, mesmo que fossem os passos do vizinho no andar de cima.
O telefone celular continuava na sua mão, tão mudo e tão imbecível.
Preguiçosamente tirou o sapato com a habilidade incomparável dos seus dedos dos pés.
Tinha chulé, morria de preguiça de secar o entrededos, mas gostava mesmo era de pedir um remédio para frieiras na farmácia, por pura diversão. Assim como o mata piolhos que comprava sempre que estava entendiada.

Não, ela não era louca. Achava-se absolutamente normal. Desesperadamente normal.
A única coisa realmente estranha era seu sonho secreto: o de soltar a flatulência mais alta de todo o universo!
Morria de rir ao imaginar todas as pessoas do mundo tapando o nariz ao mesmo tempo e olhando para quem estivesse ao lado com cara de não fui eu.
Ela sinceramente ria disso.

Súbito, foi em direção a janela. Ok, ela sentou-se de novo no sofá. Eu apenas gostaria muito de usar "súbito" no texto. Acho uma palavra tão altiva, tão sexy. Mas não acho que ela deva se matar. Então, súbito ela resolveu ligar a TV no polishop. Comprou desesperadamente 5 churrasqueiras elétricas.
Sentiu um prazer tão grande naquilo que fez seu miojo e foi dormir. No outro dia tinha que avisar para o porteiro que ia se mudar. Seu grandíssimo prazer era fazer encomendas que fossem devolvidas ao remetente. Ficava do outro lado da rua olhando e morrendo de rir.

.Rima.

Quis saber se minha vida era tão triste assim.
Assim como?
Triste assim, tipo tragédia.
Tipo muito sofrimento.

Quis saber se eu não tinha um amor,
se eu não pegava ninguém,
se eu sofri algum trauma na infância.
Quis porque quis saber de onde vinha tanta dor.

Ficou tão deziludido quando contei que era feliz.
Ele não sabia que o poeta era mesmo um bom fingidor.
Fingi naquela momento que era poeta.
E ele nem viu quando escondi meu lenço.

.Be happy.

Procuro a felicidade como um porco que chafurda na lama.
Seguindo pistas de amigos, de lembranças,
de sonhos, de amores, pistas de um amor, eu procuro a felicidade.
Ela brinca de cabra cego comigo (ou seria cobra?)

Procuro a felicidade como se ela estivesse me esperando do outro lado da rua
ou no final de uma piada.
Procuro a felicidade como quem prefere contos porque o final está a duas páginas.
A procuro seguindo um retrato falado de pessoas que eu nunca vi.


Procuro a felicidade como um porco que chafurda na lama desesparado,
como se pudesse encontrar a qualquer momento o seu reflexo.

sexta-feira, março 25, 2011

Abobrinhas ou O Conto da Abóbora.

Míseros meio metro do chão não representariam perigo se eu não fosse tão estabanada e se não chovesse tanto nos últimos dias. Aquele chão molhado parecia a terra querendo zombar de mim, esperando só hora de me ver de joelho roxo. Por isso, eu seguia com todo o cuidado. Até o dia em que descobri um outro caminho e nele, uma abóbora.
Ela estava lá no fundo, longe. Parecia ter sido esquecida pela Cinderela, Gata Borralheira ou Branca de Neve, não me lembrava ao certo. O fato é que era uma linda carruagem de abóbora que me atraia como se um fosse imã puxando minha pele de ferro.
Assim, magnetizada, segui sem tirar os olhos dela até que, de tão perto, pude ver suas teias de aranha. Eu me comovi, ela era uma abóbora abandonada num mundo sem fadas. Aonde andaria Cinderela? (Sim, àquele passo eu já tinha certeza de que a mocinha da história tinha esse nome). Fui embora com vontade de comer cabutiá.
Eu que não sou boba, nunca mais saltei o barranco e todos os dias me encontrava com a abóbora na hora de voltar para casa.
Hoje, o professor de Jogos Teatrais (não sei se já contei, mas essa história se passa numa escola de artes) nos pediu para que saíssemos da sala de aula e fossemos caminhar. Tivemos 15 minutos para observar, para ver o mundo com olhos de expectador. Incrível como raramente olhamos. Eu, que sempre chego atrasada, vi tanta coisa nesses 15 minutos! Fiquei impressionada com todos aqueles detalhes que saltavam aos meus olhos e pelos quais eu passava todos os dias sem perceber. Música por toda parte, sapatilhas e mais sapatilhas, gente pendurada em tecido, no teto, no ar, tanta coisa ao mesmo tempo! Foi numa dessas andanças do olhar que um corredor me sugou. Era o da abóbora! Segui imediatamente em sua direção para observá-la com calma como se aquela fosse a nossa chance. (Não é todos os dias que se tem 15 minutos). Tudo o que eu queria era olhar para a abóbora. Fiquei alguns instantes parada diante dela. Era tão linda, tão rica em detalhes, tão de verdade. Pensei nas mãos que a confeccionaram e nos palcos por onde ela já havia passado. Tive um impulso de entrar e sentar ali dentro. Mas me contive. Como uma criança com medo de fazer arte, olhei para os lados receosa de que alguém lesse meu pensamento e brigasse comigo. Vai que abóbora era de alguém? E se eu fosse muito pesada para ela? E se ela desmanchasse? E se tivesse cheia de fungos (seu interior era de tecido acolchoado). E se?
Aí lembrei das frases mais repetidas nas aulas nos últimos dias: “Se joga! Se joga! Não racionaliza! Não racionalizada!” Pronto. Eu estava lá dentro. Para mim foi uma travessura. Nunca fui do tipo encapetada, era a irmã mais velha – aquela que tinha que dar o exemplo – e de repente eu estava ali, me jogando e ignorando tudo o que eu havia racionalizado.Não sei conto que por um segundo pensei que ela estava flutuando e ouvi um sshhhhss... Melhor não!
Fiquei lá dentro da abóbora por alguns minutos, olhando as pessoas que passavam sem me notar, sorrindo com cara de moleque custoso para as que se surpreendiam comigo naquele lugar. Mais que isso, senti que minha alma sorria também e se arrepiava.
Vive uma espécie de transe dentro daquela abóbora. Uma euforia nova com cheiro de corredor vencido (e também de mofo). Para quem não acredita em conto de fadas, ir dormir com o da abóbora não é nada mal. Boa noite.



O BBB

Ele foi parar no paredão logo na primeira semana. Como é que podia ser tão azarado? Não, não era justo. E foi por isso que ele olhou para a faca que estava na pia. Como foi que a produção nunca pensou que poderia ser perigoso deixar uma faca lá? Alegaram que os confinados tinham que preparar a própria comida. Não dava pra fazer um picadinho sem uma faca, dava?
Tudo aconteceu numa noite de eliminação, com o Brasil todo assistindo. O Bial começava a fazer sua poesia, que daquela vez teve uma rima diferente. Aquele brother nunca gostou de analistas. Odiava psicólogos. Não era ali, nunca sofá, com um bando de gente assistindo, que ele ia se conhecer. Levantou de uma vez. Foi até a cozinha, pegou a faca e a apontou para a primeira bunduda que encontrou. Foi possível ouvir os gritos de oh! da plateia que estava do lado de fora, os gritos de espanto de dentro da casa e a poética mansa de Bial: abaixe essa faca, meu amigo. A vida também tem dois gumes.
E assim, ao vivo, um homem com uma faca fez de refém 11 pessoas, que, por ironia, já estavam presas. Nunca um cárcere tinha sido tão vigiado. E nunca tão inutilmente. Milhares de brasileiros acompanhavam pela TV o homem com a faca. A audiência era tanta que eles não tiveram coragem de tirar do ar. Batiam naquele momento todos os recordes da história. A bunduda se esgoelava. Os fortões não moveram uma palha. As outras bundudas se perguntavam porque não elas. Logo elas que tinham o pescoço tão bonito.
O homem da faca pedia R$ 2 milhões em contratos publicitários e uma cela como o quarto do líder. A polícia ameaçava invadir. Boninho ameaçava cortar a luz. O homem ameaçava cortar o pescoço. De todos, um a um. Aquela prova de resistência durou 7 minutos. Pelo twitter vazou para polícia que o louco estava ali por armação. Tinha dado um trato na magrela da produção do programa e ela deu um jeito de ele ser selecionado. O Brother da faca era dono de uma empresa de verduras picadinhas e congeladas a vácuo. Como viu que o paredão chegara pra ele antes do esperado, resolveu providenciar seu milhão e fez seu próprio merchan: ter faca em casa é perigoso, prefira verduras que já vêm cortadas. E embaladas a vácuo. Ficou preso 1 ano em hospital psiquiátrico. Nesse período, sua empresa se tornou a maior exportadora de verduras picadinhas e embaladas à vácuo do planeta. O BBB continuou, sem facas. Como disse Bial na época: a vida já é afiada demais.

(10 de fevereiro de 2010)
http://migre.me/46Zzx

domingo, fevereiro 06, 2011

Pedras para que te quero.

- Pedradas!
- Abaixa. Esse povo tá louco!
- Não é fascinante?
- O que?
- Você, eu, nós... Vítimas! Vendo a violência e a brutalidade de perto. Aqui, correndo risco... Não é incrível?
- ?
- Vou te confessar que acho muito bom...
- Você tá louco?
- Não grila não, mas eu errei aquele gol de propósito.
- O que???
- Ah cara... É um saco essa falta de emoção: condomínio fechado, segurança, carro blindado... O medo nos faz sentir mais vivos. Não acha?
- CUIDADO!
- Olha, me acertou. Eu amo essa torcida.

sábado, fevereiro 05, 2011

UTI

Meu coração tremia como se quisesse me sacudir.
Numa espécie de boca a boca da alma ele tentava me trazer de volta.
Eu não sabia se queria voltar.
Ali, naquele limbo, tudo se passava em câmera lenta.
E, num raro sem pressa, eu estava fascinada pela preguiça daquelas cenas.
Me deixa aqui, eu pedi.
E a máquina fez que sim em linha reta.

terça-feira, janeiro 11, 2011

Sussy: ésse, u, ésse, ésse, ipicilon. Grata.

Meu nome é um quebra-gelo. Jamais comecei uma conversa com um desconhecido sem ter que dizer, não, não é francês, nem apelido. Aliás, menos com atendentes de telemarketing. Com eles não tenho paciência e confirmo: sim. É suZi mesmo, meu filho. Para as outras pessoas eu explico. Não que eu goste de explicar. O que não gosto mesmo é de Suzi.
Tudo começou porque nasci em Patrocínio, Minas Gerais. Se eu tivesse nascido em qualquer outro lugar tudo seria diferente. Naquela época (uso essa expressão por mero hábito literário, já que usar “há pouco tempo” diminuiria um pouco o carácter estorieto da estória) havia um boato na cidade: " Em Patrocínio só será registrado nome composto". Danou-se. Pensou minha mãe as 45 contrações do segundo tempo. Ela já havia escolhido o nome, seria Michelly. Aliás, meu pai quem escolheu. (Essa parte da história meu pai escapou de explicar graças a toda confusão do Sussy).
A bomba havia estourado no colo da minha mãe, logo depois da bolsa, pobrezinha. Com a filha nascida e de nome escolhido ela precisa pensar num outro nome só porque um Juiz decretara uma lei estranha. (Muito provavelmente por se chamar alguma coisa como Cleovaldo e querer ter tido a oportunidade de um segundo nome para, com sorte, poder escolher se apresentar com ele).
Onde é que já se viu isso? Nome composto obrigatório. Brasil da América, presente querido professor.
Se era verdade, até hoje eu não sei. Só sei que meus pais acataram, com uma grande ideia, claro: "Vamos escolher um nome curto, a gente o ignora e chama ela de Michelly!". Aplausos emocionados invadiram a sala. Eu me lembro que chorei, mas acharam que era cólica composta e me deram chazinho.
Meu pai foi em direção ao cartório com uma missão curta e nobre: Susy Michelly.
Isso mesmo. Susy seria o nome curto a ser ignorado pela posteridade. Sim, o primeiro nome. Mero detalhe.
Acontece que minha mãe até para ignorar queria caprichar e foi clara com meu pai: Suzy com dois S, com Z é feio.
Meu pai, esposo sensato, tratou de obedecer: “Suzy com 2 S!”. O moço do cartório, mais sensato ainda, nem questionou.
Ficou assim. Sussy com 2 S, no meio.
Quando chegou com a certidão em casa foi que meu pai percebeu o erro. Minha mãe brigou: "Não era assim! Era um S no começo e outro no meio!" "Agora é que ignoro mesmo", sentenciou.
E assim fizeram, pelo menos até eu entrar para a escola.
As professoras jamais ignoram o primeiro nome. Mesmo que ele seja Armandonilda e o segundo nome, Daniela. Elas vão sempre chamar você de Armandonilda, apenas para deixar a hora da chamada mais descontraída.
Foi naquela época, por volta dos 6 anos, que nasceu a Sussy, na escola.
Para a família continuo sendo a Michelly. Para o meu avô, que atendeu o telefone de casa esses dias, "não tem nenhuma Sussy aqui não". Para a maioria dos amigos: "Michelly? Quem é Michelly?".
E eu? Ah, eu me divirto.